sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Viva com seus outros sentidos, não só com a Visão - Parte 1

E se, em vez de pensar ou teorizar, deitássemos nosso corpo sobre a beleza e os cinco sentidos? Além de reflexão ou idéia, como seria esse toque? Melhor do que uma abordagem intelectual, que tal uma encoxada na estética dos relacionamentos?

Crítica à supremacia da visão

Vivemos imersos em uma cultura da visualidade. É o excesso do sentido da visão, mais do que qualquer outro, que define a relação de nosso corpo com o mundo. Se uma empresa quer fazer aparecer seu produto (ainda que ele seja direcionado ao nosso paladar, como um chocolate), ela prepara um comercial na TV para ser visto – não ouvido, cheirado, tocado ou degustado. Publicitários sabem que é a força da imagem que movimenta nosso desejo.
Por tal supervalorização, a visão é nosso sentido mais desenvolvido e aquele que retiraria de nós a maior porção de mundo em caso de perda. Sem qual sentido você viveria melhor? Visão ou olfato? Em qual dos cinco sentidos sua namorada é mais presente para você? Por qual sentido seu marido a ama mais? Quando você lembra de alguém, qual o sentido predominante?
Em um palestra que assisti num SESC SP, o professor Norval Baitello (doutor em comunicação e semiótica pela Universidade de Berlim) falou de outras culturas em que o sentido predominante não é a visão. Em uma delas, o cumprimento “Tudo bem com você?” significa algo assim: “Como está seu cheiro hoje?”. Para ele, visão e audição são os sentidos da distância, enquanto tato, gustação e olfato são os sentidos da proximidade, da intimidade.
De fato, para um relacionamento, cheirar é muito mais importante do que ver, pois podemos ver qualquer um, mas cheirar apenas aquele que nos é próximo. A visão não define amor algum: vemos bundas na Playboy, decotes à distância, mulheres na webcam, homens estranhos ao redor. Se a visão predomina, é porque não há relação íntima. A audição também: conversamos por telefone ou Skype, ouvimos milhares de vozes estranhas em um bar… Nossa visão e audição são preenchidas por muitos com os quais não temos quase nenhuma relação.
Com nosso parceiro amoroso, no entanto, a visão e audição perdem poder. O outro está perto demais para ser visto, silencioso demais para ser ouvido. Antes ela era um quadril perfeito, costas lindas, ombros, colo e cabelos inebriantes. Sua beleza estava nos traços. Agora, no escuro do quarto, seus limites se misturam e é precisamente isto que a faz bonita. Seu quadril não é mais visto. É tocado, cheirado, empurrado, puxado, lambido, mordido. Antes ele se destacava por estar separado, pela impositiva linguagem visual, das costas e das pernas. Agora, o quadril se desdobra e nos leva às pernas e às costas. Ele é um prolongamento do prolongamento. Antes, o corpo tinha começo e fim, dos pés à cabeça, distinto do chão e do local onde se movia. Agora, o corpo é infinito: assim que o entendemos, assim que o capturamos 100%, ele muda de posição e logo o perdemos novamente. Sua mulher se estende diagonalmente na cama, você se deita em cima, tenta envolvê-la com seu corpo e descobre que, sem a visão, é impossível tocar de uma só vez a extensão completa de seu corpo. Na verdade, nem a visão consegue isso, já que é impossível ter uma perspectiva de 360º.
No dia seguinte, ela não nos parecerá bela por imagens na memória. Sua beleza estará no cheiro dos dedos e unhas (aquele que o sabonete parece ignorar e você quer que ele continue ignorando), no relevo da língua, no gosto alterado da saliva, na lembrança de como o corpo dela deslizava pelo seu – sabe aquela aura que o outro deixa a um centímetro de nossa pele?
Se nós, como sociedade, escolhemos colocar o sentido da visão acima de todos os outros, não deveríamos reclamar da falta de profundidade e criatividade em incontáveis relacionamentos. Ora, o sentido que mais estimulamos, a capacidade que mais treinamos, é justamente aquela que usamos apenas até o ponto em que tocamos nosso parceiro, até o ponto em que a relação começa.
Mais ainda, a visão é sentido da dualidade: sujeito aqui, objeto lá; olhos de um lado, paisagem de outra. Em todos os outros, objeto e sujeito se confundem. Onde está mesmo o som dessa música? Aqui dentro ou fora? Enquanto você coloca sua mão em mim, que parte do toque é sua e que parte é minha? Com um morango ou chocolate na boca, sou capaz de saber o que é morango, chocolate, o que é língua e o que é gosto de morango e chocolate? Seu cheiro é isso que vem de você ou isso que parece que brota de dentro de mim? Na verdade, a visão também funciona de modo não-dual, mas por ela é muito mais complicado vivenciar a não-dualidade. Sua ilusão de dualidade (a sensação de que o mundo está lá fora), é tão persistente que nos leva a acreditar que a cor, por exemplo, é uma propriedade dos objetos.
A visão é também o sentido pelo qual medimos a beleza: o outro é belo ou não na medida em que sua imagem é bela. Nossa experiência estética do mundo, originalmente ampla e proporcionada por cinco vias, se restringiu de tal forma que atualmente sequer usamos nariz, pele, ouvido e língua para responder à pergunta “E aí? Bonito ele?”. Usamos apenas os olhos! Esquecemos que aquele homem que parece belo aos nossos olhos talvez nos pareça horrível pelo nariz, pele, ouvido e língua. E aquela mulher que nos excita pela visão talvez não seja aprovada por nossa pele.

Uma venda vermelha

De olhos bem fechados. Para as melhores sensações da vida, cerramos as pálpebras, puxamos o ar e abrimos os poros. Percebemos que para a beleza do amor a visão é secundária. Se pudéssemos guardar algo de nosso parceiro, escolheríamos um cheiro, toque ou gosto, não algo que pudesse estar disponível no Facebook ou no YouTube.
No meio de um bar, de olhos abertos, tudo o que você vê é um bar. De olhos fechados, pode imaginar o céu acima, a rua que leva para a casa dela, a casa dela, o perfume dela, ela sem perfume, a textura da pele, o gosto da brisa do céu acima da casa dela… De olhos fechados, você não tem só um bar, você tem o mundo.
No canto da cama, de olhos abertos, você vê a boca dela vindo até a sua, armários ao fundo, teto, luminária, paredes e um quadro. De olhos bem fechados, o quarto inteiro é a boca dela, o mundo são lábios que o envolvem por completo. Você esquece que tem pés e pernas. Você não vê uma cama em um quarto em uma cidade em um país em um planeta… De olhos fechados, só há o beijo. Eis por que o amor é cego (uma venda vermelha, mais precisamente) e não deveria ser de outra forma.
Continua…
P.S.: Se quiser contribuir para a construção de uma sociedade menos imagética, ame alguém. Você naturalmente será menos refém de sua visão e vai treinar muito mais os outros quatro sentidos. O mundo se expande e as imagens se empalidecem diante das belezas cheiradas, tocadas, degustadas e ouvidas.

Por hoje é só, amanhã tem mais!
Que o GADU esteja com vocês!
.'.HERR THOR .'.
 

3 comentários:

- Hope Subway - disse...

Querido Dono...

Amei seu post... Sempre acho que seus pontos de vista são completamente diferentes de todos os outros que conheço... ou pelo menos da maioria...
Mas, de verdade, esse post fez com que eu pensasse muito na nossa relação e na sua insistência com a venda e com os olhos abertos em alguns momentos e fechados em outros...
Me fez pensar no porque dos toques... dos quentes e frios... da vela e da chama... do morango e do chocolate... e finalmente me fez ver... "De olhos bem fechados, o quarto inteiro é a boca dela, o mundo são lábios que o envolvem por completo. Você esquece que tem pés e pernas. Você não vê uma cama em um quarto em uma cidade em um país em um planeta… De olhos fechados, só há o beijo. Eis por que o amor é cego!"
Então nesse momento eu me torno seu mundo e o sr o meu??

Sua...

みope✩ღ✩

.'. Herr Thor .'. disse...

Claro, {tigerin_hope}, minha Pet, quando estou com vc, o tempo parece não passar, cada um de nós se torna o mundo do outro. Usamos bem os 4 sentidos, a visão passa a ser secundária, teu gosto, cheiro e tatear nossos corpos passa a ser tudo.
Aguarde amanhã a parte 2 do post.
ETA!
.'.HERR THOR.'.

- Hope Subway - disse...

Ai Dono...

Aguardar amanhã pelo post não é nada!
Aguardar amanhã para ve-lo é que me mata!
Quantos sentidos vamos usar amanhã???
O meu 6° sentido me diz que vamos usar os 5... ou melhor, os 10... 5 de cada um! E todos a 100%!

ETA!

Beijos açucarados, melados e saudosos...

みope✩ღ✩